O ESTADO DE S. PAULO -
POLÍTICA
A sugestão da presidente Dilma Rousseff para
classificar o crime de corrupção como hediondo foi criticada, e até ironizada,
por criminalistas, mas delegados da Polícia Federal elogiaram a iniciativa. "A
lei penal não inibe a prática de qualquer crime, especialmente o de corrupção",
avalia o advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira. "Acabar com a corrupção, ou
reduzi-la, depende sim de mudança ética. Depende da classe política e da própria
sociedade tomarem resolução no sentido de respeitar a coisa pública e não
procurar tirar vantagens pessoais. Trata-se de medida demagógica, sem nenhum
alcance prático."
"A qualificação da corrupção ativa e passiva como
crime hediondo é medida salutar à proteção da probidade administrativa e da
efetividade dos direitos fundamentais garantidos pela Constituição", afirma o
delegado Milton Fornazari Junior, da Delegacia de Combate a Crimes Financeiros
(Delefin) da PF, mestre e doutorando em Direito Penal (PUC/SP). "Por meio da
corrupção muito dinheiro é desviado da educação, especialmente em licitações
fraudulentas. Muitos agonizam e morrem em hospitais, de onde verbas públicas são
frequentemente subtraídas."
Para Fornazari, "aquele que corrompe o
servidor público, juntamente com ele, contribui para a má educação e mata
brasileiros em escala de genocídio".
Crimes hediondos estão previstos na
Lei 8.072/90. São enquadrados na legislação mais severa estupradores,
traficantes, assassinos e torturadores. Para esses a progressão de regime -
fechado em semiaberto - se dá mais demoradamente. A corrupção é punida com pena
de 2 anos a 12 anos, mas em geral o acusado recebe a mínima e não vai para a
prisão.
O promotor de Justiça Arthur Lemos Junior, que combate corrupção
e cartéis, prega que "a Justiça criminal precisa ser mais efetiva, o que
inclusive evita a existência de corruptores". "Que o corrupto seja punido com
rigor, com pena privativa de liberdade correspondente a crime cometido com
violência, em razão dos danos e repercussões altamente negativas derivados dos
atos de corrupção."
Lemos Junior faz uma ressalva. "O rótulo de crime
hediondo é desnecessário, especialmente por equiparar todos os delitos ao mesmo
patamar de gravidade e impedir a individualização da pena pelo juiz do caso.
Equivale a manejar o Direito Penal como marketing. A privação de liberdade para
o crime de corrupção passiva precisa ser efetiva, sem que seja possível a rápida
progressão de regime."
O promotor defende a aprovação do projeto de lei
que trata da Extinção de Domínio, muito debatido na Estratégia Nacional de
Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla). "Notadamente para atingir,
no âmbito cível, o enriquecimento sem causa de funcionários públicos, o que já
acontece na Itália, nos EUA, Colômbia."
O ministro Marco Aurélio Mello,
do Supremo Tribunal Federal, entende que "o que importa é a incidência das
normas". "Não será a denominação crime hediondo que vai reduzir a corrupção.
Estamos precisando de observância à ordem jurídica. Não basta o aspecto formal.
A realidade é mais importante do que a forma."
Para o criminalista Fábio
Tofic Simantob, "é triste perceber que a presidente está cedendo a instintos
conservadores, ao invés de olhar para a ala progressista, que pede mudanças".
"Ela (Dilma) está tendendo justamente ao apelo populista - com penas mais graves
se resolve tudo. É como chamar dengue de resfriado e sair propagando que a
epidemia acabou."
Fausto Macedo
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